"Torne-se aquilo que você odeia"
Ele me disse tantas coisas, e eu sei que não prestei muita atenção. Mas consegui fingir que aquele assunto me interessava. Hoje eu não sei bem por que não me interessei de verdade. Hoje que quero saber outros detalhes. Mas na hora parecia mais legal tentar prestar atenção no que Nick Cave estava cantando. Era Good Good Day se não me engano.
E, enquanto Cave dizia que aquele era um bom dia, ele foi me falando dele e sobre essa improvável história de amor. Sobre como ele simplesmente acordou apaixonado por alguém que esteve sempre lá. Como em 60 dias a vida desses dois mudou e as barreiras que antes estavam tão próximas ficaram tão distantes. Falou sobre altos e baixos, e me disse coisas sobre segurança.
Foi quando ela chegou na conversa. Ela era tão improvável. Qualquer outra garota seria óbvia demais. E eles falaram sobre atravessar a cidade apenas para dizer tchau. E falaram sobre times rivais e conflitos musicais. Sobre despedidas no aeroporto. Sobre olhares e perguntas. E entre tantas interrogações aqueles dois estavam de fato apaixonados: e até uma rocha teria notado.
Cave ainda berrava e sussurrava coisas sobre a tal Mary da música e eu lembro que fiquei orgulhoso de conhece-los. E fiquei com um pouco de inveja da coragem daqueles dois. E foi quando ele começou a me falar sobre coragem. "Torne-se aquilo que você odeia. Faça a diferença". Há alguns anos eu teria virado as costas e ido embora, mas eu entendi o que ela quis dizer com isso.
E entendi que é mais saudável exercitar meu fator de cura do que alimentar um ódio pueril e imaturo. Dois meses: passam num piscar de olhos, não? E era tão improvavel. Como olhar para uma tela de computador e sentir-se completo. Saí de lá leve e com vontade de aprender a tocar piano.
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