Always remember: Elvis is dead, gravity kills and happiness sucks!

terça-feira, julho 25, 2006

Um tango

E se eu não tivesse medo de machucar a mão quebraria esse espelho agora. De vergonha. Apenas do que vejo e em nada do que sinto. Porque justo eu, pregador absoluto do realismo agreste, demorei tanto pra perceber que tudo, tudo se resume a arte. Não existe vida, nem sentimentos, nem destino. Tudo é parte de um roteiro minuciosamente elaborado. Somos a tela do pintor, o filme do fotógrafo. E ruimos como a melodia dos músicos.

E nossa vida inteira se faz em contos de fada, em romances, dramas e suspenses. E cada passo que dermos será sempre como os dedos de Chet Baker controlando os pistões de seu trompete. E cada sentimento que expressarmos será com a voz de Gardel. E cada palavra que dissermos será como a escrita de Shakespeare. As personagens vêm e vão. Vez ou outra retornam, assombram, acalmam, confortam. Mas tudo é arte e música. E é sempre igual.

Os mesmo olhos. O mesmo ônibus com os mesmo passageiros. Os mesmo passos. Não, as ruas são diferentes. Mas o cheiro e o gosto do ar permanecem iguais. Viramos os anos, a década, o século e o milênio. Mas não viramos a página. O gosto da noite é igual. E assim como a mesma chuva, é o mesmo amor, seja na tela, no filme ou na música. E nada de errado nisso. Nada!

Porque, seja em sonhos ou na pretensa e antiga realidade, ainda me parece fazer sentido que ninguém vive e morre mais que eu. Pois assim como o surdo ama a música, o féretro simplesmente celebra a vida.

sexta-feira, julho 21, 2006

Bom dia

O muro me disse: "Só amei duas mulheres na vida. Uma morreu. A outra matei!"

A música me disse: "Dust myself up and I scream at the sky/It's been so hard but I can't let it die/Turn my head up, looking at the stars/So many years, I still wonder where you are"

A saudade me disse: "Good night, sweet prince"

O amor me disse: "Bom dia..."

terça-feira, julho 18, 2006

Wouldn't It Be Nice

Era noite de domingo. Era sete de novembro. Era o ano de 2004. Meu ombros já carregavam dois dias de trabalho pesado, meu olhos se lembravam cada segundo das noites mal dormidas, e meu corpo tinha fome apesar da náusea constante. Alguma coisa que fazia impossível ingerir algo mais denso que fumaça de cigarro e álcool. Passavam-se dois anos desde a última vez que eu estivera ali. As tendas eram bastante parecidas entre si e vi fantasmas novamente sentados nos degraus do Jockey.

Eram 20h30 quando vi Brian Wilson entrar. De passos curtos e fisionomia plácida. Um sorriso perdido entre rugas e lábios débeis. Certa senilidade no olhar. Ele precisou de ajuda para se sentar. Senti pena apesar de saber a origem de tanta dificuldade. Na sua frente um teclado e duas mil pessoas. O silêncio rompeu-se com a voz trêmula de Wilson. Comecei a contabilidade: Revolver que fez nascer Pet Sounds que fez nascer Sgt. Pepper's que fez nascer Smile. Tanto tempo depois, nasceu.

E eu já estava quase desistindo de sentir medo quando ele me pegou de costas e sem bola. Wouldn't It Be Nice, direto no joelho. Sem cartões e sem penalidades. No fundo ele estava certo. Não seria realmente legal? Tanta coisa seria diferente que eu nem precisaria me refugiar nos braços de Bersuit Vergarabat. Não seria legal se eu não tivesse torcido o pé aos seis? Não teria sido divertido se eu não tivesse arrebentado a boca aos oito durante uma partida de futebol?

Não teria sido legal seu eu tivesse dito pra Paula, lá na sétima série que ela era linda apesar de ser uma cretina sem coração? Não teria sido legal se eu tivesse escondido melhor a cola de matemática na oitava série? E não teria sido divertido se eu não tivesse fechado os olhos quando o Zetti pegou o último pênalti em 92? Alguém duvida que teria sido legal fazer tudo ao contrário e escolher sempre os outros caminhos?

Sr. Wilson certamente não tinha dúvida nenhuma. E nem por isso é acerto o que seria, ou errado o que é. Então me restou apenas levantar um brinde ao senhor Wilson e ir lá pra fora fumar um cigarro no degrau assombrado. E não teria sido legal se ele tivesse me visto erguendo o copo?


¿y que hace este angelito, ahora, a las seis de la mañana subida al mástil de este naufragio?

¿a ver si, alzando las copas, forajidas, viene un cielo de enfermeras para lamer, sin asco las heridas... de amor?

Por las noches la soledad desespera
A ver si viene del cielo una enfermera del amor

Por las noches la soledad desespera...

segunda-feira, julho 03, 2006

Suíça x Ucrânia

Segunda-feira, o que será que eu vou almoçar amanhã? O tal Minuano mostrou do que é capaz. Quase me leva na rua. Foco, mantenha a atenção. Suíça e Ucrânia, jogo das oitavas-de-final. Zero a zero. Droga, segundo tempo. Quanto tempo? Ah! 15 minutos. Foco, cacete. Mantenha a atenção.

Odeio quando minhas mãos transpiram. Molha o cigarro. Deixa um gosto esquisito na boca. Será que pode fumar aqui? Quanto tempo? Cacete, só se passaram 5 minutos? Parece uma vida. Será melhor eu subir? Passe em profundidade, chute pra fora. Esse até eu faria. Será? Teve aquela vez quando eu ainda era moleque que eu peguei uma bola dessas... Atenção, porra!

Atenção, tensão. Acho que vou fumar outro cigarro. Será que é melhor eu subir? E se eu ficar mais nervoso vendo tudo lá em cima. Não, fico aqui mais um pouco. Caralho de moleque chato. Fica gritando do meu lado. Se ele chegar muito perto eu vou chutar. Não, o pai dele deve estar por aqui. Vou só sair fora. Opa, depois do escanteio! Se cruzar ali na marca do pênalti quem sabe... Foco, meu Deus. Pára de divagar.

Foda-se, vou subir. Ali pelo menos fico sozinho. Gosto desse tipo de escada. Piso brilhando. Será que dá pra ver que to tenso? Acho que sou o único brasileiro realmente tenso enquanto passa Suíça e Ucrânia. Ali em cima não deve ter ninguém. Vou ficar por aqui. Tá acabando o segundo tempo. Bom, já vai acabar, e eu vou poder ir pra casa. Espero que eu vá com uma boa notícia.

Merda, andar cheio. Vão embora, seus bostas. Quero ficar sozinho. Ok, agora fatalmente o jogo já acabou, e vai dar prorrogação na certa. Nossa, tô tenso pra cacete. É, mãos suando, joelhos tremendo, mandíbula travada e dor no estômago. É, dor no estômago de nervosismo fazia tempo. Acho que a última vez foi na final da Libertadores. Ah sim, com certeza foi... FOCO! Porra, quantas vezes vou ter que pensar nisso. Putz, to sentindo é agora.

*A porta se abre, ela sai e sorri*

Ela passou. "Aprovada com distinção" diz a ata da defesa de tese. Hehehe! Digam olá para a mais nova jornalista. Acabou! Quanto será que terminou o jogo? Ah! Quem se importa? Fodam-se os suíços, ucranianos. E também as virgens!


Descaradamente baseado e inspirado em O último dia de um terrorista